Por
volta de 1920, uma série de fatores e acontecimentos uniram dois artistas dos
mais queridos e celebrados de sua época, que permaneceriam cultuados até nossos
dias: o escritor Conan Doyle e o mágico escapista Harry Houdini.
Nos
Estados Unidos, Houdini e suas façanhas eram celebradas, e exportadas para o
mundo. Começou como mágico de números tradicionais com cartas, mas rapidamente
se tornou notável por seus espetáculos de escapismo, que iam de camisas de
força e algemas até a temível caixa de água da tortura chinesa. Abaixo podemos
ver algumas fotos e vídeos da época.
(Primeiro filme mostrando Houdini. O salto de uma ponte com algemas)
Do
outro lado do Atlântico, na Inglaterra, o escritor Arthur Conan Doyle
conquistava leitores e também era exportado para o mundo, através dos seus
livros no gênero suspense policial, onde a lógica e o elementar eram as
ferramentas de trabalho do seu principal personagem, o maior detetive da
literatura de todos os tempos, Sherlock Holmes.
(Primeira edição de Um Estudo em Vermelho)
Paralelamente
ao desenvolvimento artístico, social e intelectual desses dois grandes homens
da razão (Houdini também o era, pois sempre afirmou serem truques de
ilusionismo o que fazia), florescia nos dois continentes as bases do que no
futuro se transformaria em uma doutrina, mas que naqueles tempos era mais
objeto de curiosidade e exploração dos crentes, o espiritismo cristão. E se por
um lado havia homens como Allan Kardec estudando seriamente esse fenômeno, por
outro havia uma legião de farsantes que explorava a fé dos que perderam seus
entes queridos, com truques que iam de mesas que levitavam nas tais “sessões
espíritas” à captação de espectros em fotografias trucadas onde espíritos se revelavam
nas chapas tiradas com os vivos.
E
qual o posicionamento dos nossos grandes homens citados perante tudo isso?
Conan
Doyle entrou de cabeça nos estudos do espiritismo, inclusive escrevendo muitos
livros sobre o tema, sendo considerado até hoje um dos grandes nomes dos
primeiros anos da doutrina. Esse mergulho no além, especula-se, foi motivado
por muitas perdas sofridas durante as duas primeiras décadas do Séc. XX: uma
esposa, um filho, dois netos, um irmão e dois cunhados. E Doyle se mantinha sempre
crente na existência de vida após a morte, mesmo descobrindo depois algumas
farsas, como as fotos tiradas com ele, onde espectros apareciam ao seu lado.
Já
Houdini manteve uma posição dúbia sobre o espiritismo de 1913 até 1920, ano que
marca seu mais profundo envolvimento com Doyle. Em 1913 morreu sua mãe, e o
amor que o unia a sua progenitora era algo tão intenso que merecia uma postagem
à parte nesse blog. Pois bem, durante esses anos ele seguiu duvidando,
investigando e desmascarando os truques dos falsos espíritas (pois ele próprio
era um especialista em truques), porém extremamente desejoso de encontrar um
médium verdadeiro que possibilitasse um contato com sua falecida mãe, a quem
ele classificava de anjo e esteio da sua vida aqui na Terra. Houdini queria
acreditar na “mágica” da vida!
(Os dois amores de Houdini: a mãe que faleceu em 1913 e a esposa)
(Houdini chegou a ser dono de cia. cinematográfica, onde era ator principal)
Entretanto,
somente em 1920, no seu encontro com o escritor Conan Doyle, o mágico Houdini
passou a enxergar esse contato entre vivos e mortos como uma possibilidade
real. Doyle lhe descreveu maravilhosos fenômenos por ele investigados, e
Houdini aceitou sair com o novo amigo em peregrinação de um ano atrás desses
possíveis médiuns verdadeiros. Mas... por onde passavam, onde o escritor via um
maravilhoso fenômeno espiritual, o mágico só conseguia enxergar o truque e a
trapaça. E seguiam um tentando convencer o outro sobre seus pontos de vista.
Era
evidente que essa amizade estava com os dias contados.
Esse
clímax aconteceu mais precisamente no dia 17 de julho de 1922, quando Arthur e
sua segunda esposa, que se dizia médium, convidaram Harry para uma sessão
privada, no quarto de um hotel onde se hospedaram os três em Atlantic City, em
férias. Jean, a esposa de Arthur, começou a sessão, e por um momento chegou a
emocionar Harry ao psicografar uma carta de 15 páginas, supostamente enviada
pela querida mãe do mágico.
Porém,
passada a emoção, Houdini notou quatro pontos gritantes que o faziam duvidar da
veracidade do contato.
1)A
carta era psicografada em inglês, e sua mãe nunca havia aprendido o idioma.
2)Na
tal carta, sua suposta mãe o chamava de Harry, e ela nunca havia feito isso,
pois Harry era apenas o seu nome artístico. Seu verdadeiro nome era Erik.
3)O
dia da sessão era o dia do aniversário de Houdini, e não havia menção a isso na
carta. Sua mãe nunca antes esquecera essa data.
4)Jean,
supostamente incorporando a falecida mãe de Houdini, começou com um sinal da
cruz. Mas a mãe de Houdini era judia, portanto...
A
representação abaixo, trecho retirado de uma minissérie sobre Houdini, mostra
bem como tudo aconteceu:
Enfim,
num primeiro momento o mágico nada disse, porém depois explodiu, indo até a
imprensa para revelar o desserviço prestado por Arthur Conan Doyle aos crentes.
Uma intensa troca de farpas pelos jornais dos dois lados do Atlântico manteve o
público ligado nas fofocas (essa era a versão dos programas de farândolas entre
celebridades daquela época).
E
esse foi o momento de ruptura entre os dois gênios, marcando também o período
militante de Houdini contra os falsos espíritas. Nesses anos, seu passatempo predileto
era invadir sessões mundo afora, disfarçado junto a policiais, e, ao descobrir
o truque usado pelos mal-intencionados, se levantar dramaticamente, retirar o
disfarce, e gritar:
- Eu
sou Houdini. E você é uma fraude!
NOTA:
Não é a intenção desse escritor criticar qualquer religião. Assim como
reconheço que sempre existiram e existem falsos religiosos explorando a fé
alheia, também reconheço que amor ao próximo e conforto espiritual pode ser
recebido em todas as igrejas. Muito menos desejo emitir um mau juízo sobre as
intenções do grande escritor Arthur Conan Doyle, gênio da literatura policial e
abnegado em sua fé.
E
você não se esqueça de clicar em “se inscrever” lá no alto da página (botão
azul).
Abraços,
Christian
Petrizi
E as fraudes do espiritismno, ao que tudo indica, persistem até hoje... :\
ResponderExcluirNem só do espiritismo, né Fátima. Por todo canto, por todas as religiões, infelizmente tem pessoas querendo ganhar enganando o próximo. O ser humano possui variações que não são tão humanas assim, se a gente analisar a fundo. Não são a regra, ainda bem.
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