Hoje eu me lembrei de quando
aconteceu a tragédia em Mariana, do número de mortos, todos de uma só vez. Eu
me lembrei de Brumadinho, das diversas enchentes que acontecem pelo país, dos
desmoronamentos de encostas nas periferias pobres das grandes cidades brasileiras,
dos 33 mineiros que ficaram presos a quilômetros abaixo do nível do solo em
Copiapó no Chile quando eu lá morava, do Word Trade Center, do tsunami na
Indonésia. Com exceção dos mineiros chilenos que tiveram um final feliz, a
tragédia impactou o Brasil e/ou o mundo pelo número de vítimas que
desapareceram da face do planeta em um instante.
Tragédias impressionam seres
humanos com sensibilidade. E a comoção se mantêm por longo tempo, normalmente. Então
as pessoas cobram soluções para os problemas, elas exigem que as autoridades
apresentem planos para que, se possível, algo semelhante não volte a se
repetir.
Em alguns casos, consegue-se o
objetivo desejado. Atualmente, companhias aéreas investigam até que os recursos
se esgotem sobre as causas de um acidente, para que o problema detectado
e que causou o acidente seja corrigido em escala mundial, e não volte a ser outra
vez causa de outra tragédia. A Justiça aplica leis punitivas para empresas que
não se preocuparam com os entornos de suas mineradoras causadoras de acidentes
mortais, paralisam suas atividades, estipulam multas, etc. Governos, como o
chileno da época em que os mineiros ficaram presos embaixo da terra, lutam
incansavelmente para salvar as vidas, e as vezes conseguem salvar todas!, como
o caso dos chilenos resgatados das profundezas, ou os neozelandeses que conseguiram
evitar os números recordes de mortes por COVID-19 com medidas severas de
isolamento social.
Eu li em algum lugar: “Bons
governos salvam vidas, maus governos causam mortes.”
E nós, como estamos nessa onda letal
do novo coronavírus? Depois de ultrapassar a barreira das 12.000 mortes, das
800 mortes por dia, parece que a normalidade voltou ao país do Carnaval... Como
se nada estivesse acontecendo.
Governos estaduais determinam
severas regras de isolamento, mesmo com o governo federal tentando amenizá-las
a todo custo, e a população tomando seu próprio caminho de ignorar os riscos,
saindo às ruas, mesmo os contaminados, expondo cada vez mais a população,
principalmente os que estão trabalhando para manter o essencial funcionando
para essa mesma população, sem nenhuma preocupação com o próximo.
Fico pensando se a diferença de
sensibilização nesse caso não estaria na acomodação dos sentimentos de
solidariedade dos cidadãos. Enquanto nas tragédias instantâneas morrem centenas
de uma só vez, na crise da COVID-19 os números foram aumentando gradativamente.
1 falecimento num dia, 30 no outro, 100, 180, 320, 600, 800... Será que isso
nos torna insensíveis ao perigo, incapazes de praticar solidariedade cuidando
de nós mesmos para cuidar do próximo, através de práticas amplamente difundidas
pelas organizações de saúde do mundo?
Eu, nas ruas, porque desempenho
serviço essencial (sou Farmacêutico) me espanto diariamente com pacientes
positivos para a doença que estão circulando normalmente pela cidade, entrando na
loja em que trabalho, comprando ao invés de determinarem que outros da família
o façam ou pedindo a entrega do necessário em seus domicílios. O comércio não
essencial continua fechado, então o que justificaria famílias inteiras, com
crianças e idosos juntos, indo a supermercados para as compras “da semana!”,
como se nada estivesse acontecendo? Teriam perdido a capacidade de se sensibilizarem
com os números crescentes de mortos no país? A morte a granel seria a causadora
dessa falta de solidariedade humana?
E, pelo andar da carruagem da
vida por aqui, tudo tende a ficar pior ainda. As pessoas vão desaparecer em números
cada vez maiores, e o povo cada vez mais insensível ignorando os riscos para todos.
Nem mesmo consigo colocar a culpa no governo federal, obscuro, negacionista, contra
a ciência, etc e tal. Porque as informações foram amplamente divulgadas pela imprensa e
medidas foram tomadas pelos governos estaduais.
O problema é a morte a granel.
Essa também precisa ser estudada “no tocante” aos efeitos psicológicos causados
em uma população desgovernada e insensível.
Christian Petrizi
Infelizmente, sou obrigado a concordar com as tuas palavras. É triste e frustrante perceber que estamos cercados de informações (no caso, as ruíns, as horríveis) que, lenta e gradativamente, vão se dando os sentidos e a sensibilidade da maioria das pessoas que, por sua vez, acabam meio que anestesiados ao que vai acontecendo... De repente, é mais uma morte, mais um desastre, mais uma calamidade, como se dentro delas ecoasse uma misteriosa voz, um decreto, "ah, é mais um, acontece sempre, eu posso ser o próximo..."!!!
ResponderExcluirE assim, vai aumentando progressivamente o número de "ilhas humanas", cada um a cuidar do seu próprio umbigo e continuar sua aventura num mundo cada vez mais moldado no "eu sou, eu quero, eu tenho, eu faço"...
E pessoas sensíveis, humanitárias vão, também, se sentindo solitárias e desamparadas em sua caminhada neste mundo de Deus.
Um mundo cada vez mais tecnológico, onde o individualismo predomina e o cidadão perde sua humanidade. Lamentável mesmo.
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